INFERNO PARTICULAR


Toda tentativa de auto compreensão é uma descida ao inferno. Acredito que este pensamento, atribuído à Kant, no diz muita coisa sobre evitarmos o autoconhecimento.

O sonho de todo indivíduo é encontrar, na solidão, a sua satisfação e prazer. Porém, precisamos do Outro para nossa realização, esse outro que pode ser qualquer fonte de prazer. 

Nesse sentido, a relação entre duas pessoas é pautada pelo egoísmo de ambas as partes. De uma lado o sujeito A, buscando prazer com o corpo e os sentimentos do sujeito B. E, por outro lado, o sujeito B age da mesma forma.
    

A idealização do Outro é uma forma de projetar aquilo que gostaríamos de ter sobre o nosso domínio. Muitas vezes, é o nosso próprio Eu que projetamos no Outro. Assim, nos esvaziamos, colocando-se em posição de negatividade e inferioridade, enquanto nos alienamos diante do Outro, entregando a este, todos os atributos que tiramos de nós mesmos. Exemplo: quando dizemos que a outra pessoa é bonita e extremamente inteligente, nos colocamos numa posição inferior. Dessa forma, estou com ela porque é inteligente. E eu? Não sou? 

Por isso, o consumo surge como uma válvula de escape para a dependência constante que temos do Outro (ou dos outros).

Ao consumir um produto depositamos nossas expectativas de prazer em um objeto que não responde, não possui desejos ou manifesta sentimentos. Objeto perfeito para nossa completa satisfação. Porém, o vazio surge logo que esse produto deixa de corresponder (por obsolescência) aos nossos desejos. As drogas são soluções baratas e rápidas, mas, destrutivas, pois elas funcionam como o estimulo perfeito do gozo solitário. A rapidez do prazer proporcionado é paga com o vício e entrega total. A miséria do viciado, nesse caso, é a de descobri que não existe prazer sem o Outro

Em todos os sentidos o inferno passa ser o Outro, objeto de constante desejo
    
Nos vemos como seres solitários e dependentes, vivendo a plena fantasia do prazer que nunca se realiza completamente. 
         
Mas, o pior, não é estar nessa situação e sim ter consciência dela. Alienar-se, torna ao meu ver as coisas muito mais fáceis. Ter consciência, ao contrário, nos coloca em tormento contante, nos aprisiona em um inferno particular.

Na introdução de um livro do Marshall Berman - "Tudo que é sólido desmancha no ar" -  ele narra a morte do filho e diz que os inocentes (crianças ou adultos), que vivem a loucura desse mundo, são os que mais sofrem, pois não possuem a compreensão dos acontecimentos do mundo. Discordo plenamente, tal como o grande raulzito, quisera eu nascer ignorante e alheio a esses conhecimentos.


P.S. 1: O título desse texto foi inspirado no álbum da Marisa Monte (Infinito particular)
P.S. 2: Escrevo esse texto horas depois de saber que serei mestrando em Estudos Culturais (estou feliz, por incrível que pareça)
P.S. 3: Agradeço à Gisele, que com suas conversas me inspirou
P.S. 4: Por uma série de motivos próximos lembrei-me dessa música/clipe do Ira! (direção do Selton Mello):

Comentários

Postar um comentário