Alguns livros deveriam ser obrigatórios, tais como nos vestibulares badalados ou para se discutir qualquer assunto, onde, quem não lê é incapaz de entrar na roda de conversa. Mereceriam destaque maior em virtude da sua grandiosidade.
A obra prima "Ensaio sobre a cegueira", do escritor português José Saramago é um desses exemplos de leitura obrigatória.
Ensaio sobre a cegueira de José Saramago |
Lembrei-me dele (o livro) pelo atual momento e por coisas que ouço, leio e, infelizmente, vejo.
Uma quase cegueira completa, onde o que persiste é o discurso do ódio, nas suas mais variadas formas e sustentado pelas mais absurdas teorias rasas e deterministas.
E, nesse terreno, ninguém escapa. Pois, parece que vivemos em terra de justos, onde cada grupo, cada ser defende que sua lógica é a correta. Não se permite um consenso ou uma análise reflexiva.
Pessoas hostilizando moradores em uma casa por causa de uma faixa, apoiando a greve de professores. Detalhe, a manifestação era contra a corrupção e por melhorias na política.
Vivemos em tempos sombrios, onde a ignorância vem com atestado, com diplomas, títulos e honrarias: "Sabe com quem está falando?"; "Segundo..."; "Isso só podia ser coisas destes..."; "Quem apoia tal...é tudo..."; "Você não sabe o que está dizendo, pois eu...".
Alunos entram numa aula de Administração da FEA-USP para falar sobre cotas, até que a professora interrompe e... segue-se um debate caloroso sobre a questão racial no Brasil.
Tem horas que tenho vontade de embarcar nessa e, num quase desespero penso em atacar. Mas, procuro resistir. Lembro-me da personagem central do livro de Saramago, a esposa do médico, ao qual não lembro se havia um nome.
Fico pensando, quando e quem possibilitará um esclarecimento, que não coloque em risco a paz e a harmonia. E não cito estas como forma de aceitação passiva, mas no sentido de manter a luta por um mundo melhor, sem que esta se baseie na raiva, no ódio, na competição, no individualismo e, principalmente, numa ignorância tendenciosa e cega.
Imagem disponível em: http://weheartit.com/entry/group/5993224
De início não entendi o por quê, mas, depois percebi que o silêncio era de medo. Como se um sentimento de impotência tivesse abatido a todos.
Senti pena, tristeza, desespero, um vazio.
Admirável gado novo, música de Zé Ramalho
Durante anos, o sistema sucateou a escola pública, empobreceu-a de recursos, limitou o trabalho de professores, defasou os salários, desvalorizando toda a categoria. Como resultado, percebi que o professor se tornou pobre. Não pobre materialmente, mas de espírito. Pobreza intelectual. Desprovido de consciência de classe. Consciência que é possível encontrar em um gari ou pessoas sem moradia, porém, não no professor.
Primavera nos dentes, música do grupo Secos & Molhados, nesse vídeo, uma versão de Karina Buhr
Pensei comigo. Se a escola, único espaço democrático para se discutir questões para a sociedade encontra-se nessa situação, se os professores são os únicos capazes de debater soluções para um mundo melhor, porém, isso não é mais possível, então, o que devo fazer?
Pela primeira vez, a possibilidade de desistir me veio a mente a até agora não saiu.
Pela primeira vez, a vontade de não mais pertencer a esse grupo.
Pela primeira vez, depois de muito tempo, me senti desesperado.
Pela primeira vez, tive medo e pensei, será que é isso mesmo? Será que o mundo é isso? Enfim, será que os ignorantes é quem darão a tônica?
De que vale, ter conhecimento, quando a cegueira é que nos guia?
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