"E sabeis… o que é pra mim o mundo?… Este mundo: uma monstruosidade de força, sem princípio, sem fim, uma firme, brônzea grandeza de força… uma economia sem despesas e perdas, mas também sem acréscimos, ou rendimento,… mas antes como força ao mesmo tempo um e múltiplo,… eternamente mudando, eternamente recorrentes… partindo do mais simples ao mais múltiplo, do quieto, mais rígido, mais frio, ao mais ardente, mais selvagem, mais contraditório consigo mesmo, e depois outra vez… esse meu mundo dionisíaco do eternamente-criar-a-si-próprio, do eternamente-destruir-a-si-próprio, sem alvo, sem vontade… Esse mundo é a vontade de potência — e nada além disso! E também vós próprios sois essa vontade de potência — e nada além disso!” – Nietzsche, Fragmento Póstumo
Tudo aconteceu no último acampamento, um lugar isolado. Encontrava-se eu, um amigo de viagem, Samuka (a figura mítica e dono do camping), Helena (uma cobra caninana de cerca de dois metros) e um hamster destemido.
A informação é de que, o hamster havia sido abandonado por um casal totalmente dominado pelo ácido, que partiu e esqueceu o pequeno roedor, num lugar inóspito e sem as condições mínimas para a sobrevivência.
A nossa aposta é que o roedor não estava mais vivo, tinha virado memória e, se ainda estivesse vivo, seria questão de horas até que Helena (a cobra) o encontrasse para sua refeição especial.
Por incrível que pareça o roedor, ainda com pelos branquíssimos, saiu debaixo de algumas madeiras e freneticamente começou a circular pelo local, tornando-se atração. Não demorou muito o peguei, dando-lhe algum carinho. Em vão ofereci-lhe pão, mas o pequeno parecia bem alimentado.
Novamente nossa aposta voltou à conversa, desta vez dando mais um dia de vida até que Helena o encontrasse ou que sua inabilidade para a vida selvagem resultasse em seu fim.
Todas as apostas perdidas. Uma semana depois, nós é que nos retiramos do local e ainda lá estava o hamster já pertencente ao local, com a astúcia desenvolvida e com suas próprias estratégias de sobrevivência.
Depois de um certo tempo, percebi que não importava mais quanto tempo o pequeno roedor teria de vida, mas a vida que teve quando abandonado à sorte. Vida essa que se iniciou quando fora esquecido e distanciado das facilidades do cativeiro. Agora, ele, não era mais escravo, não tinha mais senhores, muito menos era o bibelô de estimação de ninguém.
Diante da mata, do ambiente selvagem e desconhecido, o pequeno ratinho passou a pertencer a si, como seu próprio senhor, desenvolvendo toda uma potência. Era um forte, como um sertanejo.
Estando a sós, passou a desenvolver a fortaleza necessária para a superação das dificuldades, transvalorizou os valores, tornando um Überratte, além de qualquer rato de sua espécie, superando a lógica da natureza, essa não mais determinante, mas determinada pela sua potência e necessidade de vida.
Se ele está vivo, não sei. Se ele viveu, sim, viveu.
Muito foda esse relato, nada melhor do que estarmos em comunhão com a natureza. Como e bom voltar a casa da mãe, não é mesmo?
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